E quando no silêncio da exausta madrugada
O Magistrado olhou para o seu passado,
Viu a procissão de homens e mulheres,
Que desfilava, a passos lentos, sem rumo,
Num silêncio profundo,
Olhos desencontrados,
Perdidos na distância dos horizontes…
Viu que os olhos brilhavam em lágrimas soltas,
Que se transformavam em estrelas refulgentes…
Lágrimas que não eram de tristeza ou de dor,
Mas de comovido agradecimento…
Lágrimas quentes,
Lágrimas de mãe que acalenta o filho adormecido…
Viu braços que se estendiam, eretos, para o infinito…
Mãos abertas no vazio da penumbra…
Mas não eram mãos que pediam,
Não eram mãos que esmolavam…
Não eram mãos de vingança, ou mãos crispadas,
Que sugerissem ódio, que demonstrassem desespero…
Eram mãos serenas, de contornos suaves,
Macias de carinho e abertas para dar e não para receber…
Viu lábios entreabertos…
Trêmulos lábios que murmuravam, que sussurravam palavras,
As quais se perdiam
Nas imaginárias curvas das estrelas distantes…
Mas, os lábios não mostravam rancor,
Não estavam cerrados no desprezo e na angústia,
Não se mostravam mordidos na desesperança eNa descrença…
Eram lábios que esvoaçavam sorrisos,
Eram bocas em forma de beijos…
Beijos longos, beijos demorados,
Beijos que não eram furtivos ou traidores,
Mas que denotavam espontaneidade e sublime Reverência…
Viu até os corações, pulsando forte a rudeza da vida.
Corações descompassados, pressurosos,
Corações extuantes,
Corações cansados pelo tempo…
Mas, não eram corações de maldade ou sofrimento.
Não eram corações, batendo o desejo do mal
E do arrependimento…
Eram corações abertos para o futuro e para a fé,
Eram corações feitos de luz e de amor,
De silêncio e de paz…
Eram, enfim, corações que pulsavam a felicidade
E a esperança……
E, então o Magistrado adormeceu placidamente,
E o seu sono revelava a suavidade do dever Cumprido…
José Amorim